Folha de S. Paulo
Defensor de ampla revisão dos acordos de delação premiada, o ministro Marco Aurélio, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou que o caso de Joesley Batista, um dos donos da JBS, é emblemático porque ele foi apontado pelo próprio Ministério Público Federal como líder de organização criminosa e recebeu o benefício de não ser denunciado, apesar de confessar crimes.
A declaração foi feita nesta quinta (29) durante o julgamento sobre os limites da homologação de um acordo de colaboração, pautado justamente por causa dos benefícios concedidos aos executivos da JBS. Marco Aurélio foi vencido, e os ministros barraram a tentativa de aumentar o alcance para revisar as delações.
A lei que baliza a colaboração premiada permite que o Ministério Público deixe de oferecer denúncia em duas situações: se o delator não for o líder da organização criminosa e se for o primeiro do esquema a fechar acordo.
Mas procuradores da PRR-3 (Procuradoria Regional da República da 3ª Região), em São Paulo, de fato escreveram que Joesley liderou esquema de corrupção.
Em 5 de junho, ao oferecer denúncia contra o procurador Ângelo Villela e o advogado Willer Tomaz, os investigadores afirmaram, em nota de rodapé, que o empresário e o diretor jurídico da JBS, Francisco de Assis, "a despeito de figuraram [sic] como líderes da organização criminosa que capitaneava o grupo J&F, não serão denunciados nos presentes autos por força dos acordos de colaboração premiada firmados com a Procuradoria-Geral da República e homologados no Supremo Tribunal Federal)".
Durante o julgamento desta quinta, Marco Aurélio destacou que "o mesmo Ministério Público que fez o acordo afirmou em denúncia formalizada e subscrita por três procuradores regionais" que o delator é líder da organização criminosa.
"Quanto à liderança da organização criminosa teremos um obstáculo", afirmou.
"O que se pretende, na voz do relator, com essa homologação? Que venhamos dar um endosso -só se for no campo moral- à postura do procurador-geral da República, que combinou com o delator não propor a ação penal. Essa é uma premissa que me leva a não homologar."
Depois da sessão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi questionado sobre o assunto e desautorizou o comentário feito pelos procuradores regionais na denúncia.
"Especificamente quanto a isso, a investigação da organização criminosa é de competência do Supremo Tribunal Federal e de atribuição do procurador-geral da República. É no âmbito do Supremo que se apurará a existência, a extensão e a liderança da organização criminosa", disse Janot.
"O que se fez em São Paulo foi uma nota de rodapé, em que se afirmou indevidamente este fato. O juízo que foi feito para que fizéssemos o acordo foi justamente o oposto, que eles não são líderes de organização criminosa", afirmou.
DENUNCIADOS
Joesley citou o envolvimento de Ângelo Villela Willer Tomaz em esquema de corrupção para receber informações sobre a operação Greenfield, que apura fraudes em fundos de pensão e atingiu negócios do grupo do empresário.
Segundo ele, Villela foi "infiltrado" na força-tarefa da Greenfield para extrair dados da investigação.
Joesley disse que contratou o escritório de Tomaz por R$ 8 milhões, sendo R$ 4 milhões de pagamento inicial e mais R$ 4 milhões após o arquivamento do caso. Por sua vez, Tomaz, segundo o delator, dava uma "ajuda de custo" de R$ 50 mil para Vilella em troca de informações.
Villela e Tomaz foram presos em 18 de maio, na operação Patmos, cujas investigações atingiram o presidente Michel Temer e o senador Aécio Neves (PSDB-MG).
Ângelo Villela foi denunciado pelos crimes de corrupção passiva, violação de sigilo funcional qualificada e obstrução da investigação de organização criminosa.
Willer Tomaz foi acusado pelos crimes de corrupção ativa, violação de sigilo e obstrução da investigação de organização criminosa.
A denúncia tramita no Tribunal Regional Federal da 3a Região, pois, como procurador, Villela tem prerrogativa de foro por função.
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