A tragédia da Covid-19 no Brasil não é visível apenas na impressionante marca, atingida nesta quinta-feira (29), de 400.021 óbitos, segundo o consórcio dos veículos de imprensa. Em meio a falta de vacinas e um governo questionado em CPI por sua ação na pandemia, o peso do novo coronavírus sobre o sistema de saúde também surge em outro indicador — uma em cada cinco mortes notificadas no país (21,7%) desde março do ano passado é decorrente da doença.
O índice foi calculado a partir de dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), entidade que representa todos os cartórios do país. A primeira morte provocada pela pandemia, segundo registros oficiais, ocorreu no dia 17 de março do ano passado. Desde aquele mês, o Brasil contabilizou 1.843.281 óbitos totais. A associação assinala que os cartórios são responsáveis pelo fornecimento de dados — e o número, portanto, pode estar defasado — mas a relação de um quinto deve permanecer.
Apesar do percentual elevado, pesquisadores entrevistados pelo GLOBO acreditam que ela pode ser ainda maior: a subnotificação ainda é alta no país, já que muitos infectados pelo coronavírus morrem em casa, sem recorrer ao atendimento médico, devido ao colapso do sistema hospitalar. Há, também, óbitos por Covid-19 que são registrados como síndrome respiratória aguda grave (SRAG) sem causa determinada.
A escalada da pandemia é comprovada por seguidos recordes batidos nas últimas semanas. Desde a chegada do coronavírus no Brasil, houve 18 ocasiões em que o país registrou mais de 3 mil mortes diárias em decorrência da doença — 13 vezes em abril e cinco em março deste ano.
O Brasil é o segundo país em óbitos acumulados, atrás apenas dos EUA (cerca de 575 mil), e também o segundo no registro de novas ocorrências da Covid-19 na última semana, ranking liderado agora pela Índia. A taxa de letalidade mais que dobrou, de 2% no final de 2020, para 4,4% na semana passada.
Platô elevado
Um boletim divulgado nesta quarta-feira pela Fiocruz demonstra sinais tímidos de queda no número de casos (-1,5% ao dia) e óbitos (-1,8% diários) por Covid-19 no país. Para Barcellos, seria um indicativo de que o Brasil teria atingido ao pico da pandemia. No entanto, como a reprodução do coronavírus ainda é acelerada, não há tendência de queda na curva epidemiológica.
— Isso significaria que chegamos a um platô, da mesma forma como na primeira onda, em meados de 2020. A diferença é que, desta vez, estacionamos em um índice muito mais elevado. No ano passado, eram cerca de mil óbitos por dia. Agora, atingimos até 3 mil — alerta. — A lição que deveríamos ter aprendido é que este momento deve ser o de reorganização de serviços, e não de flexibilização total.
Outro obstáculo é a circulação de variantes do coronavírus, especialmente a P.1, que emergiu na Amazônia em novembro do ano passado. Um estudo divulgado na quarta-feira (28) pela Secretaria estadual de Saúde de São Paulo indicou que a variante foi detectada em 90% de 1.439 sequenciamentos genéticos analisados pelo Instituto Adolfo Lutz (SP).
A primeira onda do coronavírus demorou meses para atingir o país inteiro, destaca Barcellos. A P.1. cumpriu o mesmo trajeto em semanas. Não está comprovado se a variante é mais letal, mas, segundo pesquisadores, a velocidade do contágio poderia atrasar a erradicação da pandemia.
O Globo
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